sexta-feira, 21 de julho de 2023

 Gato por lebre

Vale acusada de exportar resíduos de cobre como se fosse ouro

Relatórios de duas CPIs apontam rombo de cerca de 447 milhões para os cofres da União e do Estado do Pará

 

Por: Amazônia Real

Reportagem publicada na semana passada (precisamente no dia 13/07)*   pelo portal do UOL em São Paulo revelou, com base em investigações de comissões parlamentares de inquérito no Pará que a mineradora Vale vendeu ouro para fora do Brasil sem pagar royalties por pelo menos 10 anos. O minério foi extraído de duas minas de cobre, Sossego e Salobo exploradas pela empresa na província mineral de Carajás, nos municípios de Canaã dos Carajás e Marabá, no sudeste paraense.

De acordo com as CPIs, a empresa deixou de pagar R$ 446,7 milhões referentes à CFEM (Compensação Financeira pela Exploração Mineral) pela exploração de ouro não contabilizada nas duas cidades. As CPIs calculam ainda que a omissão das vendas do ouro pela Vale resultou numa diferença de R$ 20 bilhões na balança comercial brasileira.

Procurada pelo UOL, a Vale disse que “efetua regularmente o recolhimento dos tributos e impostos” e paga os impostos “de acordo com a legislação específica do tema”. A Agência Nacional de Mineração disse ao portal que “desconhece a situação”.

“Existem diversos processos de cobrança de CFEM no âmbito administrativo tendo como polo passivo a Vale”, mas nenhum trata da exploração de ouro em Marabá e Canaã dos Carajás, declarou a ANM (que substituiu o DNPM).

Para chegar a essas conclusões, a CPI da Assembleia, contratou a consultoria MC Consultoria Empresarial para analisar os relatórios de produção, os balanços financeiros e as informações prestadas pela mineradora ao Siscomex (Sistema Integrado de Comércio Exterior da Receita Federal). A empresa declarou aos investigadores que lança a exploração e venda de ouro em seus balanços, mas não em seus relatórios de produção.

Os mais de R$ 400 milhões que os vereadores de Marabá acusam a Vale de não ter pagado são o resultado da conta feita pelos integrantes da CPI. Para chegar ao valor, eles consideraram a cotação do ouro no mercado financeiro, caso o ouro não tivesse sido registrado como “subproduto do cobre”.

Para chegar à “CFEM provável” que os vereadores acusam a Vale de dever, a CPI de Marabá fez contas a partir das informações enviadas pela CPI da Assembleia Legislativa do Pará. De acordo com o relatório parcial da CPI de Marabá, a empresa extraiu 7,7 milhões de toneladas de cobre de Sossego e Salobo entre 2012 e 2022. Sobre esse valor, de R$ 65,4 bilhões, a mineradora recolheu R$ 1,2 bilhão de CFEM.

No mesmo período, relata a reportagem do portal, a Vale produziu 93,2 toneladas de ouro cadastrados como subproduto do cobre, conforme o balanço da empresa. Declarou R$ 832 mil como valor de venda. Entretanto, segundo a CPI de Marabá, o valor real desse ouro seria de R$ 320 o grama. Ou seja, 93,2 toneladas deveriam custar R$ 29,8 bilhões.

A CFEM provável, de 1,5% sobre o valor da venda do ouro, portanto, seria de R$ 446,7 milhões. Desse total, R$ 293,6 milhões seriam referentes à mina de Salobo, em Marabá, e R$ 153,9 milhões, à mina de Sossego, em Canaã dos Carajás.

De acordo com o relatório parcial da CPI do Salobo, enquanto o ouro “na contabilidade final da Vale enriquece os acionistas, para o povo de Marabá é apenas subproduto do cobre”. “Tais riquezas não podem passar despercebidas, pois demonstram a grandiosidade mineral do estado do Pará, enquanto sua não declaração reduz o estado a uma pequenez não condizente como sendo a maior província mineral em atividade no mundo”, diz o relatório parcial da CPI do Salobo.

A CPI constatou que a mineradora enfrentava, na época, 50 processos administrativos e judiciais referentes à CFEM. Em 2021, o diretor jurídico tributário da Vale, Octávio Bulcão, disse que existe uma discussão jurídica sobre da base de cálculo para o pagamento da CFEM.

Segundo ele, a taxa “não tem amadurecimento jurisprudencial para pagarmos. Carregar um contencioso não é bom, mas precisamos achar soluções dentro de uma governança. No relatório contábil entregue em abril deste ano à SEC (sigla em inglês para Securities and Exchange Commission, órgão regulador do mercado financeiro dos Estados Unidos), a Vale disse que enfrenta “diversos processos judiciais e administrativos” por causa da CFEM. Essas ações discutem o equivalente a R$ 9,56 bilhões, incluindo o valor principal do tributo, juros e correções.

A assessoria de imprensa da ANM disse ao UOL que a Vale responde, hoje, a 124 processos administrativos e judiciais que tratam da cobrança da CFEM. Mas, para os deputados estaduais do Pará, a postura da Vale é “inaceitável”. No relatório, a CPI disse que o Superior Tribunal de Justiça definiu, em junho de 2007, que a base de cálculo da CFEM é o faturamento líquido correspondente às ‘receitas de venda do produto mineral, excluídos os tributos incidentes sobre a comercialização, bem como as despesas de transporte e de seguro do produto mineral. Fazendo sucessivos recursos à Justiça, o objetivo da mineradora seria “procrastinar os pagamentos, utilizando-se, para tanto, dos recursos vários e protelatórios cabíveis no ordenamento jurídico”.

Procurada pelo UOL para comentar as alegações das CPIs, a Vale disse que “o produto final das minas do Sossego (Canaã dos Carajás) e Salobo (Marabá) é o concentrado de cobre”. Também disse que a CFEM é paga “de acordo com a legislação específica do tema e se baseia na precificação desse concentrado”.

 

P.S.: Transcrito na íntegra do Portal Amazônia Real, assinado pelo jornalista Lúcio Flávio Pinto

* o adendo é nosso

* A manchete e a "gravata" também são de responsabilidade do pôster

       
                             Foto: Portal Amazônia Real


Operação da Vale, no sudeste do Pará, estaria sonegando royalties milionários 


quinta-feira, 20 de julho de 2023

 Pinguelas

Colonos clamam por infraestrutura em estradas vicinais

Pequenos produtores rurais vivem, literalmente, na corda bamba e reclamam da ausência do poder público

 

NILSON SANTOS

 

Pequenos e médios produtores rurais que vivem no Projeto de Assentamento (PA) Tamboril, na região da Vila Santa Fé, zona rural de Marabá, sudeste do Pará, estão tendo muitas dificuldades para escoar suas produções agrícolas. As estradas vicinais são de péssima qualidade, e, aonde são cortadas por algum rio ou igarapé, a situação fica ainda pior. Não há pontes. Essas áreas são servidas pelas famosas “pinguelas”, muito comuns no interior.

Esta semana a reportagem foi procurada por alguns moradores do PA Tamboril, quando relataram o verdadeiro drama que vivem na época da colheita. Sem estradas adequadas e sem pontes seguras, quem se arrisca corre o risco de sofrer acidentes. Muitos já tiveram enormes prejuízos, pela falta de condições de escoar seus produtos para os centros de consumo.

O agricultor Leônidas Vicente, é um dos que sente na pele o drama de trabalhar nessa, segundo ele, “parte esquecida pelo poder público do município”. Leônidas tem na produção de leite uma de suas principais atividades. É o que garante o sustento da família. Mas as dificuldades, segundo ele, são muitas para colocar o produto junto ao mercado consumidor.

Alfredo Silva, vizinho de Leônidas, corrobora do sentimento de abandono que ele e outros produtores da região sentem. “O ano todo é de sofrimento. No inverno é o lameiro e no verão, como está agora, é poeira e ‘puaca’ para infernizar nossas vidas”, reclama o colono.

Tanto Leônidas Vicente, quanto Alfredo Silva reclamam também das “pinguelas”, aquelas pranchas de madeira que servem, de forma paliativa, de pontes nos locais cortados por rios e igarapés. E que não são poucos. Ambos já presenciaram acidentes nessas verdadeiras “armadilhas”. “Teve companheiro que já tombou em um desses rios e perdeu toda a produção que estava carregando”, conta Leônidas. Sem falar no prejuízo do próprio veículo. “Escapou com vida por milagre”, lembra.

Para Sezostrys Alves, ex vereador de Palestina do Pará, é inadmissível que em pleno ano de 2023 ainda se presencie situações tão caóticas, segundo ele, como a vivida pelos moradores do PA Carajás Tamboril. Aliás, lembra ele, uma realidade que se repete também por outros assentamentos e vilas da zona rural de Marabá.

Para Sezostrys, “uma visível falta de compromisso para com o homem do campo, que tanto produz e contribui com a arrecadação municipal”.

O político, que tem profunda afinidade com a Vila Santa Fé, já que também possui terras naquela região, lembra que o volume de produção agrícola que sai daquela área, bem já merece pontes decentes de concreto armado. “Por aqui passam carretas e mais carretas carregadas de gado, minério, cargas de açaí, produção de leite, entre outros produtos. Está mais que na hora de garantir mais segurança para os usuários dessa região”, reivindica Sezostrys.

Recesso – O pôster tentou contato com o presidente da Câmara Municipal de Marabá (CMM), vereador Alécio Stringari, para saber de algum posicionamento do Poder Legislativo em relação ao problema, bastante recorrente, vivido por centenas de moradores da região da Vila Santa Fé e outras zonas rurais do município. Por conta do recesso parlamentar, não foi possível estabelecer comunicação.

Alécio Stringari tem estreita relação com a Vila Santa Fé, entre outras comunidades daquele eixo de produção agrícola e mineral.


                        Fotos: De Redes Sociais

Pranchas de madeira são as "pontes" paliativas que servem a região  


Ir, ou não ir, eis a questão

"Pinguelas" constituem verdadeiras armadilhas para os produtores da região